Depois de um jantar maravilhoso, muitos mimos e uma enorme prenda sensacional que trazia na mão…abro a porta para a rua e dou de caras com os olhos mais tristes que já vi!
À partida não entendemos bem o que aquilo seria…porque estaria um cão ali preso com a trela amarrada a um pilarete do passeio a metro e meio da porta do edifício. No chão, com uma camisola velha aos pés, com duas tigelas pequenas…uma com água, outra com uns biscoitinhos…deitado, e a fazer aqueles olhos a fazer lembrar um peluche triste…com a cabeça de lado e a olhar para o fundo da rua…como que à espera de alguém.
Teria alguém subido e por momentos deixou-o ali?... Não
faria sentido, mas nem queria acreditar noutra hipótese que me parecia tão
absurda.
Aguardei uns minutos, de prenda enorme na mão, ali em pé, ao
lado dele.Toquei para os meus pais a saber se alguma vez o tinham visto por ali.
Com os minutos a
passar, a realidade parecia ser cada vez menos inevitável…as férias de alguém…tornaram-se
o pesadelo adivinhem para quem?...
Sem saber o que fazer, tentámos encontrar solução que não parecia acontecer.
Telefonemas vários…mobilização de vizinhos que por ali passaram àquela hora, alguns com seus cães que iriam passear à rua e deram connosco de volta de uma bola de pelo que pedia por ajuda, sem saber se confiava.
Os seus olhos não enganavam. Eram sinceros. E os sentimentos eram evidentes…o medo que sentia era imenso. Em local desconhecido ali abandonado, estava muito assustado. Mas nunca por uma única vez foi capaz de mostrar os dentes a ameaçar qualquer um de nós que se tentava aproximar e acalmá-lo. Assustava-se, fugia, mexia-se…e cada vez se enrolava mais na trela que o prendia ao poste.
Entrei dentro de um ecoponto para ir buscar cartões grandes
que pudessem dar-lhe um pouco mais de conforto. Montei-lhe ali um cantinho para
se arrumar…mas continuávamos sem saber o que fazer. Ali o deixar? Vontade de o
levar…
Por muito pouco não o levámos. Seria uma inconsciência, sei
bem que sim. Não tenho condições para ter um cão, algo que sempre me custou
muito, pois adoraria poder ter um. E aquele então…que nos tocou com o olhar daquela forma…
Ninguém é obrigado a
ter animais, tal como ninguém é obrigado a ter filhos. Mas se decidem ter, é
preciso saber assumir a responsabilidade e não brincar com uma vida assim
largada na rua. Não são obrigados a gostar deles, não têm é o direito de os
tratar mal.
Não conseguíamos arranjar solução para o animal. Àquelas
horas da noite tudo parecia mais complicado. Por muito que tentássemos. Mas
também ninguém lhe conseguia virar costas. Mesmo os que subiram a suas casas,
passado uns minutos estavam a voltar, todos pelo mesmo motivo, não conseguiam
estar descansados sem saber se ele ficava bem. Uns traziam mais água, outros
com sugestões novas. E depois iam outra vez embora, sempre para voltar passado
um bocado…era inevitável não sentir.
Ele continuava a não deixar que lhe tocasse, para ver um
nome, um número, alguma coisa na coleira, ou simplesmente para fazer uma
festinha…assustava-se com medo do que fosse acontecer.
A noite começou a ficar mais fria e fui até ao carro ali a 5
metros dele, para fazer mais uns telefonemas. E foi nesse instante em que ele
voltou a olhar para nós e os olhos dele disseram claramente: “Também
me vão abandonar aqui…?”
Tentei segurar as lágrimas. É claro que não. Nunca mais
conseguiria dormir tranquilo se ali o deixasse na rua. Soa a lamechas, eu sei...mas o que é que se há-de fazer...não vale a pena tentar mentir.
Abri a porta do carro, e ele levantou-se dando logo um passo em
frente na nossa direção… E novamente tentei segurar as lágrimas enquanto lhe tentava explicar
que não podia levá-lo para um apartamento pequenino e no qual tinha de ficar 13
horas por dias sempre sozinho. Não poderia ficar com ele…mas também não o
poderia deixar ali na rua. E muito menos deixar que fosse para os canis da
zona, nos quais o destino é exclusivamente um…
Finalmente, e antes de cometermos uma loucura inconsciente
de o trazer, conseguimos ter uma ideia.
Ali no prédio, a casa dos arrumos do prédio, a cargo da porteira estava mesmo à
mão. Com luz, com arejamento, com espaço para eles estar. Com tecto, com
condições. Protegido. O abrigo que ele precisava para passar a noite. Graças ao
Tiago e à D.Maria ele ali poderia ficar. E logo pela manhã cedo ela lá estaria.
E também ali todos os que naquela noite o tentaram ajudar o veriam e
espreitariam logo cedo como ele estava.
Ajeitámos o espaço para ele se acomodar. Arranjámos uma
corda bem grande para ele se poder movimentar bastante por todo o
compartimento. E fomos desamarrá-lo do poste. Assim que peguei na trela…abanou
o rabo. Olhou para cima e ouvi claramente os olhos dizerem: “Bora”.
Farejou, roçou, entrou. Deixámos a comida e mais água. A “caminha”
onde ele se sentou logo. E ali ficou a olhar através do vidro da porta para
nós. Calmo e a dizer: “Não se preocupem. Aqui
fico bem esta noite. Obrigado.”
Logo pela manhã, soubemos de uma senhora que trabalha mesmo
em frente do prédio e que há pouco tempo andava a procurar um cão para ter…e
tínhamos esperanças que o amanhecer trouxesse um brilho novo ao olhar.
Adormeci a pensar nele. Acordei a pensar nele. Pedi que se
ainda pudesse ter uma prenda mais, que fosse um lar para ele….Chegou-me agora a informação de que essa possibilidade não se confirmou…por motivos de saúde, o filho dela não pode estar com animais em casa, e também ela ficou derretida pelo olhar do cão assim que o viu e lamentou não o poder levar.
E por isso passámos para o plano B que ontem combinámos também com o Tiago. Um contacto de uma
amiga dele que trabalha num canil de adopção, que os recebe, cuida e procura
donos que os mereçam! Sim, pois o princípio correto a seguir é que os donos é
que têm de merecer os animais, não ao contrário!
A esta hora após ter recebido várias visitas para ver como ele
estava lá no prédio dos meus pais, já deve estar a caminho para ser acolhido e levado para o
novo espaço onde conhecerá outros amigos que passaram pelo mesmo trauma e
esperam a visita de alguém que lhes possa dar o carinho que eles merecem e têm
para retribuir.
Sim, também já sei que o Witsel se sente bem no Clube e que o Benfica vai ter uma equipa feminina
de Hóquei em Patins já esta época, treinada pelo Paulo Almeida, numa aposta que
se espera tão bonita quanto vencedora…mas hoje só consigo pensar nos olhos que
vi ontem à noite.
E logo por ironia, em
pleno Agosto…quando saí à rua esta manhã, dou conta que esta noite choveu…ou
seriam lágrimas? Felizmente tiveste abrigo.
Já encontrei outros animais, já ajudei a encontrar donos
para alguns outros anteriormente, mas nada que se assemelhasse com esta
brutalidade. E como este caso haverá tantos outros.Foi o cão que alguma vez me fez sentir mais sensibilizado por me ter olhado nos olhos…e no entanto…nem sequer consegui dizer com toda a certeza, se seria um cão ou uma cadela… (mas penso que é uma menina)
Sei isso sim, que era meigo, lindo e tinha os olhos mais sinceros que já vi…
Não seria justo para
ti…mas desculpa não te poder fazer mais feliz do que esta noite fiz!
Quem souber de alguém que possa dar uma nova cor a alguém
que merecia muito…ele será levado para Torres Vedras! E é por lá que irá aguardar por um sorriso na APA – Associação para a Defesa dos Animais,
que curiosamente, ou talvez não…foi fundada precisamente no meu dia de
aniversário! Comemorou 30 anos (menos 2 do que eu) de existência neste dia 12 Agosto. Por uma boa causa!
http://apa-tvedras.blogspot.pt/http://www.animalife.pt/apa-tvedras/
http://apatv.no.sapo.pt/
Boa sorte! Para ti, e
para os teus novos amigos… És um Campeão!
Partilhei esta situação de ontem à noite e adoraria poder levá-lo comigo, mas ainda não tenho condições de poder ter um cão. Concordo plenamente quando se diz que os cães ou qualquer outro animal, devem ter donos que os mereçam e eu ainda não mereço ter um, pois ainda não tenho condições para o ter...
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