terça-feira, 28 de janeiro de 2014

A Lenda Calabote

 

Sempre me intrigou a história do Calabote, caso que frequentemente é recordado pelos nossos adversários, principalmente pelo clube nortenho. Como disse o nazi Joseph Goebbels "Uma mentira repetida mil vezes torna-se verdade" e esta história foi nisso que se tornou.

No Campeonato Nacional de 1958/59 quando se chegou à 26ª e última jornada (22 de Março), marcado por inúmeros casos, FC Porto e Benfica estavam igualados em pontos e na primeira fórmula de desempate, já que haviam empatado os dois jogos entre ambos. O FC Porto tinha então uma vantagem de quatro golos na diferença total entre tentos marcados e sofridos, pelo que tudo se iria decidir nos jogos  Torreense-FC Porto e Benfica-CUF. Conta a lenda que o SL Benfica ganhou 7-1 com a ajuda do árbitro que marcou três grandes penalidades inexistentes e que prolongou o jogo por 10 minutos, sagrando-se campeão nacional. A “prova” da verdade desta história foi a irradiação da arbitragem do árbitro Inocêncio Calabote.

Como todas as lendas esta história tem um fundo de verdade, para ter alguma credibilidade, mas está cheia de invenções, próprio das lendas. A única verdade é que o SL Benfica ganhou à CUF por 7-1, mas tudo o resto é pura fantasia.

Prolongamento
O prolongamento não teve 10 minutos. O árbitro não deu mais de três a quatro minutos de descontos, plenamente justificados pelas constantes perdas de tempo dos jogadores adversários. O SL Benfica atrasou a entrada em campo (no início e ao intervalo), facto que levou a que o clube fosse então (justamente) multado, num total de 6 minutos, que somando aos descontos deu a perceção de 10 minutos de atraso.

O Benfica não foi em nada beneficiado com essa arbitragem. E o árbitro até teria tido todas as possibilidades de “dar” o título ao SL Benfica, já que marcou o seu último golo aos 38 minutos da segunda parte e, quando o jogo de Torres Vedras terminou, o Benfica ainda teve cerca de dez minutos (seis regulamentares e mais três a quatro de “descontos”) para marcar aquele que lhe daria o título.
Já agora, recorde-se também a declaração de Cândido Tavares, treinador da Cuf, ao “Mundo Desportivo”: «O resultado justifica-se. Mas o árbitro foi demasiado longe na marcação das grandes penalidades. Não achei justo que assim sucedesse. Pena foi que não adotasse agora no final o mesmo critério, não assinalando um autêntico “penalty” quando Durand derrubou Cavém. Era quanto a mim mais razoável”. Estas palavras são elucidativas. Se o árbitro tivesse desejado “oferecer” o título ao Benfica teria tido flagrante oportunidade.

Lendo os jornais da época nada fazia prever a criação da Lenda Calabote. Ficam aqui trechos da altura:

·         Alfredo Farinha, em “A Bola”: “O recurso sistemático aos pontapés para fora do rectângulo, a demora ostensiva na marcação dos livres e lançamentos de bola lateral, as simulações de lesionamentos, o uso e abuso, enfim, de todos esses vulgarizados meios de “queimar tempo” (…) dificilmente encontram, no caso de ontem, outra justificação se não esta: a Cuf não jogou, exclusivamente, para si mas também para uma outra equipa (a do FC Porto) que estava à margem da luta travada na Luz.»;

·         Ainda Alfredo Farinha, na apreciação ao trabalho do árbitro: «No que se refere ao prolongamento de quatro minutos, cremos ter deixado, ao longo da crónica, justificação bastante para o critério do sr. Inocêncio Calabote.»;

·         No “Mundo Desportivo”, Guilhermino Rodrigues não comungava da mesma opinião, mas até considerou menor o tempo de desconto e acabou por o justificar: «Exagerado o período de três minutos que concedeu além do tempo regulamentar para contrabalançar os momentos gastos em propositada demora pelos  cufistas.»;

·         No “Record”, em crónica não assinada (um antigo hábito do jornal), uma outra opinião: «Deu quatro minutos (…) pela demora propositada dos jogadores da Cuf – alguns deles foram advertidos – na reposição da bola em jogo. Não compreendemos porque não usou do mesmo critério no final do primeiro tempo, dado que aquelas demoras se começaram a registar desde início.»

Grandes penalidades
A acrescentar à fantasia dos dez minutos de descontos, há também quem fale nas três grandes penalidades que o árbitro assinalou a favor do Benfica. Os jornais foram unânimes em considerar indiscutíveis o primeiro e o terceiro e apenas o segundo deixou dúvidas. Estamos a falar num jogo de 1959 em que não havia repetições na televisão até à exaustão. Se hoje em dia há casos em que se discute a semana toda (e às vezes mais) com toda a tecnologia existente, imaginem há mais de 50 anos.

 
Irradiação da arbitragem do árbitro Inocêncio Calabote

O árbitro não foi castigado por causa de ter dado os tais quatro minutos a mais, nem pelas grandes penalidades, mas pelo facto de ter omitido no relatório que o jogo havia começado atrasado. Segundo a Nota de Culpa e o Relatório dos inquiridores da Comissão Central de Árbitros, publicados na Revista do “Expresso” de 22 de Novembro de 1997, esse facto implicaria um castigo de suspensão por seis meses. Mas o árbitro havia sido anteriormente suspenso devido a um decisivo CUF-Belenenses em juniores, da época anterior, e dessa acumulação de castigos resultou a sua irradiação da arbitragem. Segundo a Nota de Culpa, o árbitro afirmou que, pelo seu relógio, o jogo começou às 15 horas (embora tivesse acrescentado que ignorava se o relógio se encontrava “certo pela hora oficial”) e teve os regulamentares 10 minutos de intervalo, sendo o jogo prolongado por dois minutos “pela demora propositada, na reposição da bola em jogo, por parte dos jogadores da CUF”.

O árbitro Inocêncio Calabote disse, na entrevista ao Expresso, que foi alvo de vingança devido ao jogo referente ao 1º castigo, pelo novo presidente da Comissão Central de Árbitros, o Dr. Coelho da Fonseca, adepto do Belenenses, à época um dos quatro grandes. Neste jogo o árbitro não validou um golo ao Belenenses, numa bola que bateu nos 2 postes e que não entrou, impedindo o clube de se sagrar campeão nacional de juniores. Ninguém protestou mas, apesar disso, passados uns meses, é suspenso por 30 dias pelo referido presidente. Passado pouco tempo é irradiado por ter preenchido mal o relatório do jogo do Benfica-CUF.

O Benfica afinal não foi campeão
Tanto se escreveu sobre esta história e nunca se refere que quem foi campeão na época 1958/59 foi o FC Porto, pois acabou por ganhar 3-0 ao Torreense.

O FC Porto entrou com quatro golos de vantagem sobre o Benfica (na decisiva diferença total de golos) mas, ao intervalo, o Benfica já estava em vantagem: ganhava por 5-0 à Cuf, enquanto o FC Porto vencia em Torres Vedras por 1-0. Entretanto, na Luz, o resultado foi fixado em 7-1 quando havia sete minutos para jogar, mas em Torres Vedras, a dois minutos do fim, o FC Porto fazia 2-0 e, a vinte segundos do final, Teixeira marcou o terceiro e decisivo golo. O Benfica jogou ainda dez minutos, mas não conseguiu o golo que lhe faltava.

 O Torreense, que sofrera o primeiro golo quando tinha um jogador fora de campo, lesionado, jogou com dez jogadores, por expulsão de Manuel Carlos, desde os 20 minutos da segunda parte, e ainda viu ser expulso outro jogador a seguir ao 2-0 (por pontapear a bola para longe depois do golo), sofrendo o 3-0 quando já só tinha nove homens em campo. Casos houve, pois, no jogo Torreense-FC Porto, com a arbitragem de Francisco Guiomar a ser contestada pelos jogadores locais.
 
Conclusão
A verdade é que o nome de Francisco Guiomar não ficou para a história, mas o Inocêncio Calabote toda a gente conhece. Confesso que sempre ouvi o mau pai falar do Calabote e pensava que seria uma página negra da história do clube, mas afinal não passa duma caluniosa invenção.

Essa época teve mais histórias, todas a prejudicar o Glorioso, mas se quiserem mais pormenores vejam tudo no blog BENFICA até debaixo d'água, onde tirei estas informações.

3 comentários:

  1. Acho que temos é de começar a falar nesse Francisco Guiomar, numa espécie de estratégia de marketing de guerrilha.

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  2. E os outros dois irradiados? Aquele que prejudicou o fcp nas Antas contra o slb.. O Benfica ganhou dois um golo de Eusébio de grande penalidade inexistente, tres metros fora da área. O árbitro foi irradiado porque o presidente do slb da altura, César brito, ofereceu um automóvel ao árbitro. O árbitro foi irradiado mas o slb ficou com os pontos e foi campeão. Quanto ao presidente do slb aconteceu.. Nada

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